sexta-feira, 12 de junho de 2009

Queda nas trevas

O dia cai sem ter estado em lado nenhum,
Corro a cortina e fecho-o numa caixa impossível,
Guardo-o na algibeira e sigo para a terra fora do tempo.
Todos os cigarros que não fumei jazem apagados no cinzeiro
E todas as mulheres que não amei acolhem o sémen de quem nunca fui.
O mundo apaga-se, mas fora continua aceso e vibrante, vivo,
Só eu me canso e me responsabilizo de ter sentido tão pouco
Na possibilidade de ter podido sentir muito.
Não vou mentir muito. Se o que disser não for verdade,
É porque o que conheço é só mentira e ilusão e sonhos para nada
E desejos para ninguém e para todos.

A carta de feliz aniversário que não cheguei a enviar,
Na mesa onde está espalhada a minha alma,
É agora inútil para um destinatário que já não é.
O dia acaba e eu sem ter feito nada para o acabar!
Todos vivem fora disto, estou seguro que sim,
Mesmo não o sentindo, não estando na sopa de vida dos outros.
Como posso estar assim comigo?

O orgasmo interrompido de ontem preenche o vazio incompleto de hoje,
Mas hoje estou só, desejo estar só e não me suporto!

As rosas não as vejo, não as sinto, só o aroma me chega difuso
Entre o cheio acre e cinzento da minha existência.
(Ainda tenho entranhado nos poros feromonas íntimas de janelas por onde se entra verdadeiramente
E isso pesa-me como se tivesse gente às costas,
Tão diferente do salto da ponte enquanto me venho!)
Mergulho! Mergulho na água, neste verão frio,
Na água da excitacão alheia que nem me interessa,
Não egoísta, humano somente.

Péssimo! E não sei o que adjectivo, porque não conheço a vida,
Como todos com suas vidas e vidas duplas,
Santos de cú aberto para quem lhe quiser rebentar a moral,
Libertar na sua amoralidade sensorial, porque sentir é pecado
E pecar sabe bem, sente-se mal, mas só dentro no que é falso.
(Bocas cheias de desconhecidos no futuro que nunca terão,
Dos maiores desconhecidos que não sabem conhecer e abocanham com a fúria de um vazio maior.)

O dia que foi tudo, o tudo mais recente, a minha vida resumida
Escrita nisto que já se apaga e foi nada afinal.
Todos que quase não me tocaram e lavarei com a água inconsciente
Que me percorrerá a mente externa que me dá ao que sou dentro.
Tudo se fecha em nada e o tudo é tão pouco!
...sem ter estado em lado nenhum, o dia cai...


Savonlinna

12-06-2009

João Bosco da Silva

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