domingo, 21 de junho de 2009

Adolescência de um Aldeão

Sou rural por natureza!
Tive extases a ouvir Tristão e Isolda e o Holadês Voador.
Levei a Genealogia da Moral quando fui com o meu pai sulfatar a vinha.
Passei uma noite inteira n´O Banquete com um Sócrates mais verdadeiro.
Sonhei com um amor imortal como nos tempos de cólera que nunca chegou e morreu.
Presenciei desde as margens do Tuela à luta épica entre o velho e o peixe.
Discuti com o padre velho da terra a moral em Dostoievsky,
Enquanto partilhei com ele uma das suas últimas Quatro Estações na sua última estação.
Vi com o paroco da terra F1 e ouvi U2, visitei a neve, Salamanca... desisti de deus.
Fui o primeiro ateu assumido da família e dos conhecidos – nunca ninguém me tinha dito que não existia.
Cruzava a perna com um livro enquanto os outros sentiam cedo outras verdades no corpo.

Fui o pior dos aldeões!
Pensei que me tornaria sábio, culto, maior, mas não!
Aprendi apenas que nunca saberei o suficiente e que aprender é para nada.
Apenas me dei conta da minha ignorância.
Dei-me conta de um sinal que sempre tive mas nunca tinha visto
E achei-me mais feio.
Vi-me ao espelho e não era perfeito.
Afastei-me dos outros para me encontrar e afinal estava neles.

Sou rural e gosto das casinhas juntas e do cheiro quente a madeira nas lareiras no Inverno.
Sou rural e gosto que falhe a luz para que se acenda uma vela com a vida toda à sua volta.
Sou rural e gosto de dar uma escapadela ao rio quando o tempo começa a aquecer e as roupas das mulheres são menos.
Sou rural e gosto das fodas nos lameiros, nos palheiros, nos bancos traseiros nas noites de festa de Verão.
Sou rural e gosto de rimas, dos santos populares, do S. João que torna a cidade grande em muitas aldeias.
Sou rural e gosto de profanar um adro em boa companhia, seja líquida ou das que se liquefazem.

Sou um aldeão que aprecia àrvores mortas que falam com maior prazer
Quando debaixo da frescura de uma viva.


Savonlinna

20-06-2009

João Bosco da Silva