quarta-feira, 29 de julho de 2009

Adeus a um Amigo


Ao Aylo do infinito no olhar.

Morreu o meu cão! Morreu e disseram-me a notícia
Como se uma pedra tivesse caido de um muro velho.
Morreu e parece que a quem o soube lhe pesou como perder algo esquecido.
Morreu o pobre que nem alma tinha e agora foi-se para sempre.
(O céu dos cães é uma mentira que os adultos contam às crianças
E o céu dos homens é uma mentira que se contam os adultos uns aos outros.)
Nada interessa, o meu cão está morto!
Se alguém o matou não sei, mas estou certo que algo foi, o tempo ou um parente.
Se alguém o matou não interessa, também ele morrerá,
O cão está morto, já não é cão, é cheiro e alimento para os decompositores.
Os olhos mais sábios que os olhos dos sábios humanos fecharam-se para sempre
E perderam o azul. Afinal o céu era só um espelho.
Quem me irá dar esperança numa vida sem pensamento
E me irá provar que vale a pena o para nada, só para andar a correr,
Cheirar os cus uns dos outros quando não os beijamos mesmo,
Saltar em todas as cadelas que a tenham pronta para isso,
Comer e cagar logo ali, onde se foi bucar a comida,
Rapar na terra na esperança que as marcas sejam para sempre,
Mas nem nós... os cães sem pêlo. Não foi uma pedra que caiu do muro,
Por isso haja algum respeito para quem o respeito não passava de um som quando se diz.
Morreu o meu cão e agora está morto. Morreu e agora não é mais, não é,
É, mas se caisse do muro agora era uma pedra.
Vou mergulhar num rum das caraíbas e tentar encontrar-te lá no fundo,
Onde sei que não estás mesmo, porque é só o meu fundo, onde tu não passas de uma memória.
Quantas vezes me inspiraste em vida, mais que qualquer musa?
Esta é a primeira vez que me inspiras na morte e com a morte,
Tu e ela a guiar-me as mãos, batendo negro no branco, fingindo que imortalizo mortais.

Savonlinna

29.07.2009

João Bosco da Silva

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